No Dia Mundial da Educação, celebramos a importância do ensino como pilar fundamental para a construção de um futuro mais justo e sustentável. Neste contexto, entrevistamos o Professor António Nunes – coordenador do Centro de Inovação Pedagógica do ISAVE (CIP-ISAVE), um espaço dedicado à reflexão, à inovação e ao desenvolvimento das práticas pedagógicas no ensino superior. Ao longo desta entrevista, o coordenador partilha as motivações, os desafios e as metas do CIP-ISAVE, destacando como este centro procura transformar a educação no ISAVE e inspirar uma mudança significativa no ensino superior.
1. O que motivou a criação do Centro de Inovação Pedagógica (CIP-ISAVE)?
(Professor António Nunes) – A criação do CIP-ISAVE foi motivada pelo crescente sentimento de que o ensino superior precisa de exibir um outro tipo de abordagens pedagógicas. Com as mudanças rápidas na sociedade e no mercado de trabalho, tornou-se essencial preparar os estudantes não apenas com conhecimentos técnicos, mas também com competências transversais e pensamento crítico. O centro visa, por isso, o fortalecimento da profissão docente, tendo em atenção a importância do professor como pessoa, reconhecendo as suas singularidades, valores e capacidade de influenciar, positivamente, a formação dos estudantes; a valorização da sua experiência e reflexão, incluindo o seu conhecimento acumulado e a sua prática reflexiva; o investimento da escola e do coletivo na profissão docente; a promoção de ambientes colaborativos e apoio institucional que incentive os docentes a assumirem um papel ativo na produção de conhecimento e na transformação das práticas educativas. Penso que a criação do CIP nasce do entendimento da instituição, da inutilidade do apelo à reflexão dos professores se, ao mesmo tempo, a mesma não encontrar formas de a promover e proteger.
2. Quais considera serem as principais lacunas ou desafios que o ensino-aprendizagem enfrenta atualmente e como o CIP-ISAVE pretende abordá-los?
(Professor António Nunes) – Gostaria, em primeiro lugar, de refletir sobre o mundo que nos cerca e no qual, em breve, os nossos estudantes terão uma intervenção que considero determinante. Vivemos num mundo marcado por profundas contradições: desigualdades gigantescas entre e dentro dos países; padrões de vida extremamente elevados coexistindo com disparidades nunca antes vistas; democracias liberais desaparecendo ou transformando-se em “democracias musculadas”; tecnologias avançadas beneficiando alguns, mas gerando tensões sociais para a maioria; e mudanças climáticas que, há poucos anos, eram impensáveis, mas que agora produzem catástrofes que ameaçam a humanidade e outras espécies.
Enfrentamos, ainda, o surgimento de novas pandemias, que comprometem a nossa liberdade e direitos humanos individuais; modelos económicos que priorizam lucros de curto prazo em detrimento do bem comum; fundamentalismos religiosos fomentando discursos de ódio; e o enfraquecimento das instituições e da participação da sociedade civil. Em essência, temos optado por um estilo de vida que, aos poucos, desequilibra o planeta como um todo.
Diante dessa realidade, o recente relatório da UNESCO de 2022 chama a atenção para a urgente necessidade de repensar o futuro do planeta. Ele destaca a importância de transformar os sistemas educativos, desde o pré-escolar até o ensino superior, e convoca-nos a atender ao que seu título sugere com uma enorme simplicidade, mas também profundidade: reimaginarmos os nossos futuros juntos, desafiando-nos a (re)aprender a trabalhar coletivamente na construção de um novo contrato social para a educação.
Este é o grande desafio da escola que, levado à prática, dará início a um novo ciclo nos sistemas educativos. Temos, por isso, de reinventar a Escola se desejarmos que ela cumpra um papel significativo nas sociedades do século XXI.
3. Um dos principais objetivos do CIP-ISAVE é promover a reflexão dos docentes sobre as suas práticas pedagógicas. Que impacto espera que esta iniciativa tenha no dia a dia dos professores e, consequentemente, nos estudantes?
(Professor António Nunes) – Espera-se que essa iniciativa promova uma maior consciencialização dos docentes sobre suas próprias práticas, incentivando uma melhoria contínua no ensino. O objetivo é desenvolver uma nova pedagogia baseada na solidariedade e na cooperação; um novo tipo de currículo, fundamentado em conhecimentos compartilhados que pertençam ao patrimônio da humanidade; a defesa de uma escola comprometida com a sociedade, alinhada nos seus desafios e necessidades; uma educação sem limites rígidos de espaço e tempo, capaz de se adaptar a diferentes contextos e públicos; uma escola de diálogo e participação, construída coletivamente por todos e voltada para atender a todos. Se assim for, estaremos todos no bom caminho.
4. Outra vertente é a integração de tecnologias educacionais. Como vê o papel das tecnologias no ensino-aprendizagem e de que forma o CIP-ISAVE irá facilitar essa integração?
(Professor António Nunes) – As tecnologias desempenham um papel fundamental ao possibilitar novas formas de ensino e aprendizagem, como sejam os ambientes virtuais, a gamificação, as salas de aula invertidas, as aprendizagens baseadas em projetos (ABP) ou o acesso a recursos educativos globais. O CIP-ISAVE facilitará essa integração oferecendo formações específicas, promovendo a experimentação de novas ferramentas e criando espaços de colaboração onde os docentes possam explorar soluções tecnológicas adaptadas às suas necessidades. No entanto, recordo que é fundamental combater a ilusão tecnológica, a falsa crença de que ferramentas avançadas, serão a solução para os desafios da educação. Esses recursos, embora sejam auxiliares valiosos, não têm o poder de resolver os problemas educacionais por si só.
5. Enquanto coordenador do CIP-ISAVE, quais serão os seus maiores desafios e que metas pretende atingir a curto e médio prazo?
(Professor António Nunes) – Os maiores desafios incluem a promoção e a adesão dos docentes às iniciativas do CIP e a garantia que as soluções propostas sejam eficazes e sustentáveis. Sabemos que o dá sentido à formação dos professores é o diálogo entre eles, a análise das suas práticas e a procura, em conjunto, das melhores formas de trabalho.
Assim, a curto prazo, a meta passa por institucionalizar momentos de reflexão em conjunto, implementar formações regulares e criar um repositório de recursos pedagógicos. A médio prazo, busca-se consolidar o CIP-ISAVE como um centro de referência em inovação pedagógica, tanto no ISAVE quanto em colaboração com outras instituições.
6. Por fim, no Dia Internacional da Educação, que mensagem gostaria de deixar à comunidade educativa e, especialmente, aos docentes e estudantes do ISAVE?
(Professor António Nunes) – Neste Dia Internacional da Educação, reforço que a educação é o pilar fundamental para a construção de um futuro mais justo e sustentável. Aos docentes, incentivo a abraçar a inovação e a refletir constantemente sobre suas práticas. Aos estudantes, desejo que encarem a aprendizagem como um processo constante e transformador. Juntos, podemos construir um ambiente educativo inspirador e inclusivo, onde todos possam atingir o seu potencial máximo. Gostaria, ainda, e recorrendo a Lee Shulman, de recordar que para ser professor, não é suficiente apenas ter domínio sobre um conhecimento específico, é essencial entendê-lo profundamente em todas as suas subtilezas e implicações.